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A intervenção arquitetónica de reabilitação de habitações tradicionais é apenas uma das componentes do projeto, mais abrangente, denominado ‘Projeto de Valorização Turística do Vale de Ribeira da Torre’, financiado pela UE e implementado pela ONG Atelier Mar em 2010. O projeto de reabilitação é assim, mais do que a ideia de vários edifícios num lugar específico, uma intervenção feita também a partir da arquitetura e das pessoas, de forma a poder transformar o lugar, com o máximo de recursos locais existentes e suas soluções auto-suficientes.

A Ribeira da Torre localiza-se no concelho da Ribeira Grande, no lado Norte da ilha de Santo Antão. O acesso principal do Vale desenvolve-se ao longo da ribeira e os aglomerados de casas vão surgindo nas encostas de uma forma muito informal, convidando as pessoas a descobrirem os vários percursos ao longo dessas encostas. Partindo dessa morfologia do vale, foi criado um novo produto turístico, sustentado no conto tradicional do boi Blimundo- “Os caminhos de Blimundo”. Esta dimensão simbólica agrega o projeto no seu todo, sustentando a metáfora dos percursos entre as casas.

 

Foram reabilitadas 6 habitações tradicionais, onde foram organizados 8 quartos, 4 ‘cuznholas’ (cozinhas de lenha) e mais duas estruturas num ‘curral de trapiche’ (parte do processo de fabrico do grogue de cana) para Núcleo Museológico e loja associado ao mesmo.

 

Para o Núcleo Museológico o desenho do programa implicava que se pudesse reinterpretar o espaço sem interferir no funcionamento do curral de trapiche, processos de produção do grogue. Foi reabilitado o espaço da casa de calda onde, além de presenciar e conviver com quem controla o processo de fermentação da calda, se pode fazer uma leitura desses processos através de painéis informativos. Num segundo espaço é através da exposição de alguns utensílios ligados a esse processo que a leitura é completada. A outra estrutura desse núcleo foi praticamente reconstruida, pois encontrava-se um muito mau estado. Esta foi transformada numa loja de apoio ao núcleo, respondendo ao interesse para a venda de alguns produtos turísticos desenhados para este projeto e outros já desenvolvidos, na área do design alimentar.

 

Na loja foram usadas na cobertura telhas de sisalocimento produzidas na comunidade de Lajedos, do outro lado da ilha. O pavimento que foi usado no Núcleo Museológico e também nos quartos das casas reabilitadas é de lajetas de betão prensado. Para o revestimento interior de todas as paredes foi usado um reboco pozolânico que, no caso dos quartos, trouxe outro conforto visual para o espaço, com uma vantagem enorme em termos de isolamento térmico, mantendo os espaços sempre frescos. Noutros casos, foi simplesmente usada a cal, técnica tradicional também com vantagens na climatização dos espaços.

 

Em suma, em termos construtivos havia no projeto duas vertentes que interessava trabalhar. Por um lado, ir buscar às práticas da arquitetura vernacular todo o conhecimento construtivo inerente a estas construções, de acordo com as tradições do local (as estruturas de pedra e barro, as coberturas de colmo, ventilação) e, por outro lado, introduzir novas tecnologias de construção local, baseadas em algumas experiências já desenvolvidas pelo Atelier Mar noutras comunidades, reveladas necessárias e eficientes. Havia que conseguir trabalhar essas duas dimensões de uma forma equilibrada e sustentável.

 

Inspirado no desenho das carpintarias antigas, foram redesenhadas todas as carpintarias das estruturas, introduzindo a meia porta e uma pequena janela fundamentais tanto para uma ventilação permanente como para uma iluminação mínima dos espaços.

 

Localização. Ribeira da Torre, Santo Antão, Cabo Verde

Data. 2011

Arquitetura. Ângelo Lopes

Conceito. Leão Lopes

Colaboração. Ivo Lopes

Fotografia. Ângelo Lopes

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